Comercializador de energia 4.0 e os avanços no mercado livre

Márcio Sant’Anna
  • 03/09/2021
  • 7 min de leitura

Apesar de desafiador, o cenário do setor de energia caminha a passos largos em direção a uma série de avanços. Essa conjuntura, sobretudo força grandes mudanças no comercializador de energia, que agora segue o conceito 4.0. Além disso, pautas importantes têm aquecido o setor, como a crise hídrica e a alta das tarifas. Em contrapartida, há outros tópicos que revelam um horizonte promissor para a energia elétrica no Brasil.

Diante da grave crise de escassez de água nos reservatórios hidrelétricos, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) lançou recentemente novo alerta sobre os desafios do setor elétrico brasileiro neste ano. O aviso da entidade indica que a capacidade de geração de energia do país pode chegar ao limite em novembro.

Simultaneamente, esse panorama puxa a alta das tarifas de energia elétrica, agora por meio da Bandeira Tarifária “Escassez Hídrica”, estipulada pela Câmara de Regras Excepcionais para Gestão Hidroenergética (CREG), no valor de R$ 14,20 a cada 100 kWh, e terá vigência de 1 º de setembro/2021 a 30 de abril/2022, provocando aumento de 6,78% na tarifa média dos consumidores regulados. Nesse ínterim, vale ressaltar que os consumidores que estão no mercado livre, e que já tinham energia contratada, fogem desse custo adicional. Por outro lado, os consumidores no mercado cativo não têm essa liberdade de negociação prévia de contratos, portanto ficam reféns das tarifas.

Além disso, a pandemia no Brasil continua provocando impactos socioeconômicos importantes. O ritmo de vacinação em massa, por exemplo, ainda não imunizou totalmente nem a metade da população. Com isso, a melhora da atividade econômica e o crescimento da população empregada ainda não foram suficientes para amenizar o choque causado pela Covid-19.

Apesar da crise econômica, o consumo de energia tem alta

Mesmo com toda essa movimentação, tivemos aumento do consumo de energia elétrica no país. Por exemplo, em maio, o acréscimo foi de 12,4% em relação ao mesmo período do ano passado. Isso representa um volume consumido de 62.1 gigawatts médios. A alta foi puxada pelo mercado livre de energia, com crescimento de 26,2%. Ao passo que, o mercado regulado, que tem o preço definido pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), cresceu apenas 6,2%, de acordo com a CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica). Nesse meio tempo, há também a excelente possibilidade de abertura integral do mercado livre de energia. Essa expansão prevê a participação de consumidores menores, inclusive os residenciais, a partir de 2024.

Enfim, recheado de assuntos quentes, o cenário pode criar um ambiente de ameaças à primeira vista. No entanto, não há dúvida de que o nosso olhar segue na direção das tendências e oportunidades para médio e longo prazos, principalmente no mercado livre de energia. Dessa forma, os desafios bastante conhecidos do setor ganham uma nova e positiva dimensão.

Modernização do setor e transição energética estão entre os avanços mais aguardados pelo mercado de energia

Tendências setoriais, tecnológicas e de mercado devem criar novos espaços de atuação e incrementar complexidades a serem exploradas pelo comercializador de energia. Nesse sentido vimos, somente neste ano, a chegada do PLD Horário e a plataforma de derivativos de energia se tornarem realidade. Isso sem mencionar o novo mercado de gás, prestes a despontar no Brasil. Além disso, podemos citar também o crescimento do uso das fontes renováveis de energia e da negociação de I-RECs.

Entre as tendências para o setor energético no pós-Covid, segundo mais recente estudo da KPMG, somam-se:

  • avanço regulatório em prol da transição energética;
  • modernização do setor elétrico;
  • aceleração da implantação de empreendimentos renováveis;
  • definições regulatórias e impacto cambial como drivers da expansão da Geração Distribuída;
  • avanço no processo de privatização;
  • práticas ESG e certificados de origem impulsionando ainda mais as energias renováveis;
  • segurança cibernética como pauta prioritária;
  • sofisticação da gestão dos processos de comercialização e amadurecimento gradual do mercado de derivativos;
  • maior atenção aos ativos de transmissão e ao impacto de mudança do regime de chuvas sobre a produção de energia hidrelétrica.

Amadurecimento do setor elétrico demanda novos produtos ao comercializador de energia

Com isso, vemos um claro amadurecimento do setor energético, em especial do mercado livre, em que o comercializador de energia deixa de ser visto apenas como comprador e vendedor do insumo. Atualmente, o comercializador de energia deve atuar como fornecedor de soluções. Em face de tantas expectativas, as empresas do segmento seguem com novas estratégias para oferecer serviços ainda mais completos.

Tal sofisticação e complexidade demandada pela evolução do mercado de energia, na verdade, têm facilitado a criação de novos produtos pelas comercializadoras. Por consequência, elas direcionam um leque ainda mais interessante de opções para os consumidores. Em outras palavras, o gerenciamento aliado a uma inteligência de mercado avançada e madura se tornará cada vez mais importante na relação entre comercializadoras e compradores de energia, criando oportunidades para ambas as partes.

Mercado livre exige gestão mais eficiente a fim de criar oportunidades para comercializador de energia e consumidor

O mercado está mudando e não há dúvidas de que os avanços serão ainda maiores. Por exemplo, o PLD Horário criou a necessidade de uma gestão mais complexa e impôs um novo controle de risco para o comercializador de energia.

Da mesma forma os traders têm aprendido novas maneiras de administrar o risco e já entendem que uma gestão financeira mais eficiente é mandatória. Essa situação vai exigir parcerias cada vez mais próximas entre clientes e comercializadoras, tanto com atendimento interno ou por meio do suporte de novas tecnologias.

De forma geral, aumentar o percentual de redução com os custos de energia será uma corrida mais do que necessária. Nesse contexto, com geração distribuída solar, autoprodução, PLD, automação, deslocamento da demanda, armazenamento, baterias; aumentando a exigência do mercado como um todo.

Assim também, os derivativos abrem contratos financeiros, que poderão criar benefícios tributários. Um produto muito bem-vindo para baixar o custo alto da energia, o qual demandará de um relacionamento mais estreito entre quem vende e quem compra.

Gestão de recursos continua sendo um dos maiores desafios para as empresas no Brasil

Por fim, a eficiência operacional e a gestão de recursos continuam sendo os maiores desafios para as empresas. Entre eles, a energia elétrica continuará entre os seus três maiores custos na operação. Ou seja, uma fatia estratégica relevante onde os centavos podem fazer a diferença. É nesse momento que as comercializadoras devem mostram que a migração, que hoje oferece possibilidades de redução do custo com energia de até 30%, tem muito outros benefícios. Inclusive, com adesão à autoprodução de energia. Em resumo, a inteligência dessa gestão será o passo mais marcante das comercializadoras 4.0. E não há limite para os avanços desse mix, que reúne tecnologia e digitalização do setor. Ademais, o mercado também conta com mão de obra cada vez mais especializada, inteligência de mercado de alto nível e uma forte parceria estratégica, muito mais próxima ao cliente.

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