Geração Distribuída no Brasil: a Lei 14.300 institui Marco Legal em 2022

Natália Rodrigues
  • 06/05/2022
  • 6 min de leitura

Lei 14.300: o Marco Legal da Geração Distribuída no Brasil

Não é incomum que temas relevantes sobre o futuro do Setor Elétrico Brasileiro despendam anos em discussão. Além disso, muitas vezes eles permanecem sem uma definição capaz de afastar incertezas regulatórias no curto, médio e longo prazo. Por esse motivo, a publicação da Lei 14.300, em 06 de janeiro de 2022, conhecida como Marco Legal da Geração Distribuída (GD), foi amplamente comemorada pelo mercado. Agora, o consumidor que optar por investir em micro ou minigeração de energia possui mais segurança e previsibilidade sobre o retorno do seu investimento em Geração Distribuída no Brasil.

Há uma década, a Resolução Normativa 482/2012 permite que os pequenos consumidores, conectados na baixa tensão, possam produzir a própria energia por meio do Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE). Nesse mecanismo, reverte-se em créditos, toda a energia injetada na rede, de origem obrigatoriamente renovável. Esses créditos, portanto, são capazes de abater as componentes tarifárias que constituem a fatura de energia. Ou seja, isso representa economia na conta de luz e, de bônus, o consumo de energia limpa.

A publicação do marco legal da geração distribuída no Brasil

A publicação do Marco Legal da GD veio justamente estabelecer o futuro do SCEE. Desde 2018, a alteração das regras de compensação está em pauta. A alteração do Art. 7º da REN 482/2012, por exemplo, estabelece que pode-se utilizar o crédito de energia para pleno abatimento das componentes tarifárias. Em outras palavras, isso significa que a injeção de 1 kWh de energia na rede é capaz de compensar o pagamento integral do consumo de 1 kWh, exclusos tributos. Essa mesma regra continua válida no chamado “Período de Vacância” previsto na Lei 14.300/2022. Posteriormente a essa data, as componentes passam a ser parcialmente custeadas. Isso dá início a um período transitório que, embora represente a perda de parte do direito vigente, é consideravelmente mais atrativo do que a proposta inicial do regulador.

Período de Vacância e a Regra de Transição

O art. 25º da Lei 14.300/2022 prevê as regras de compensação atualmente aplicáveis durante um período de 12 meses, a partir da sua data de publicação. Com isso, o empreendedor deverá protocolar uma solicitação de acesso junto à distribuidora até 06/01/2023. Caso contrário, estará automaticamente inserido em uma regra de transição.

Nessa nova metodologia, a valoração dos créditos de energia passará a desconsiderar parte da componente TUSD – Fio B, que remunera os serviços de distribuição. Sendo assim, a injeção de 1 kWh na rede abaterá menos de 1 kWh de consumo, exclusos tributos. Então, o faturamento da componente TUSD – Fio B seguirá a seguinte regra de transição:

  • 15% a partir de 2023;
  • 30% a partir de 2024;
  • 45% a partir de 2025;
  • 60% a partir de 2026;
  • 75% a partir de 2027;
  • 90% a partir de 2028
  • Regulamentação permanente a partir de 2029, a ser definida*

*De 2029 em diante, uma regulamentação definitiva deve ser implementada. Suas diretrizes competem ao CNPE e à ANEEL. As regras devem ser publicadas em até 18 meses da data de publicação do marco legal. 

No entanto, a regra de faturamento muda imediatamente após o período de vacância apenas em dois casos particulares. São eles:

  • autoconsumo remoto acima de 500 kW em fonte não despachável;
  • ou geração compartilhada em que um único titular detenha 25% ou mais dos créditos de energia

Nesses casos, a nova metodologia, então, considerará:

  • 100% da TUSD – Fio B até 2028;
  • 40% da TUSD – Fio A até 2028;
  • 100% dos encargos Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e Eficiência Energética (EE) até 2028;
  • 100% da Taxa de Fiscalização de Serviços de Energia Elétrica (TFSEE) até 2028;
  • Regulamentação permanente a partir de 2029. A ser definida.

Rumos da Geração Distribuída no Brasil

Além de uma nova regra de compensação, a Lei 14.300/2022 traz uma série de outras disposições. Todas são importantes entender o futuro da geração distribuída no Brasil.

Uma delas é a categorização de fontes despacháveis e não despacháveis para fins de limitação de potência.  Hoje, podem atuar no mercado usinas de fonte renovável com capacidade igual ou inferior a 5 MW. Posteriormente ao marco legal, a determinação de potência passa a considerar a possibilidade de despacho da fonte. Nesse sentido, apenas usinas despacháveis poderão seguir com a capacidade de 5 MW, com única exceção para a solar fotovoltaica. Nesse caso, também considerar-se-á despachável a usina com sistema de armazenamento por baterias equivalente a 20% da potência instalada, cuja capacidade se limite a 3 MW.

Também se visualiza um esforço do regulador em, provavelmente, aumentar o nível de planejamento e controle sobre os projetos em andamento. Isso porque passará a ser obrigatória a apresentação de garantia de fiel cumprimento para os projetos de minigeração distribuída. As condições para acionamento da garantia ainda devem ser regulamentadas. No entanto, entende-se que estas devem seguir o movimento de impedir o crescimento desregulado de solicitações de acesso. Sob o mesmo ponto de vista, a lei também passa a vetar a transferência de titular sem que antes ocorra a solicitação de vistoria do ponto de conexão.

Outro ponto interessante é a inserção, ainda muito tímida, do conceito de venda de créditos de energia para a concessionária ou permissionária a qual a unidade consumidora-geradora está conectada. Hoje, na dinâmica vigente do SCEE, não se pode vender créditos. Com isso, eles são estes acumulados pelo período de 60 meses em caso de não compensação. Caso não os utilizem, os créditos expiram e não pode-se aproveitá-los posteriormente. Então, possivelmente, explorar-se-á o conceito de venda de créditos futuramente.

Conclusão

Em síntese, esse e outros pontos deixados em aberto pela Lei 14.300/2022 demonstram que ainda há um longo caminho de discussões e definições pela frente. Apesar disso, o Brasil já deu os principais e mais difíceis passos. A geração distribuída findou raízes mais sólidas e robustas na construção de uma matriz elétrica brasileira cada vez mais limpa e sustentável, por exemplo.

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