Usualmente, digo aos meus conhecidos que não existe monotonia no setor elétrico brasileiro. Entra ano e sai ano, existem mudanças regulatórias, volatilidade de preços, climatologia atípica, crises econômicas e/ou políticas. Tudo isso, regado a muitas outras surpresas, fazem-se presentes na agenda do setor de energia. De certa forma, algumas são bastante positivas, mas outras nem tanto.
Em 2021 não foi diferente e o ano termina extremamente desafiador para o mercado de energia no Brasil. Talvez, arrisco dizer, o mais desafiador desde a criação do mercado livre de energia!
Na avaliação geral, enfrentamos inúmeras interferências em vazões e restrições operativas do sistema, as quais trouxeram ainda mais volatidade aos preços de energia. Isso, sem que fossem refletidas as reais condições dos reservatórios. Além disso, houve aumento significativo de encargos que, consequentemente, impactou no preço de energia para os consumidores.
Ademais, os desafios do setor elétrico brasileiro sofreram ainda a influência dos impactos da COVID-19. Nesse sentido, um emaranhado de problemas econômicos, sociais e políticos deixaram, não só o Brasil, como o mundo inteiro em constante estado de alerta.
E não menos importante, tivemos ainda uma situação hídrica sem precedentes, agravada por anos de hidrologias ruins. Essa situação só não nos levou a um novo racionamento de energia, justamente por termos tido um baixo ou nulo crescimento econômico.
O cenário é tristíssimo, pois o racionamento só não foi adiante por conta da recessão econômica. Isso porque, segundo especialistas, um eventual racionamento de energia elétrica devido à crise hídrica pode praticamente zerar o crescimento do país em 2022. Previsão que pode se tornar realidade caso haja uma redução compulsória de 10% no consumo de eletricidade.
O que o setor elétrico brasileiro pode esperar para 2022?
Mantendo o mantra de que não há monotonia no setor elétrico brasileiro, visualizo 2022 com desafios que não são inéditos.
É fato que iniciaremos o ano com uma previsão de chuvas mais generosas para o próximo período úmido, o que deve trazer certo alívio para os reservatórios das hidrelétricas. Porém, certamente insuficiente para eliminarmos o fantasma de um novo racionamento, que mais uma vez fica momentaneamente afastado. Isso muito mais devido a mais um ano sem crescimento econômico, como se mostrará em 2022, do que por uma solução definitiva do nosso deficitário sistema hídrico.
Ou seja, apesar de sinais de preços mais baixos para ano que vem, podemos esperar momentos de alta volatilidade caso as previsões de chuvas sejam frustradas. Isso a depender da boa vontade de São Pedro.
Modernização e abertura do mercado livre em pauta
No campo regulatório, iniciaremos o ano com expectativas relacionadas aos projetos de lei, PL-414 e PL-1917, que trazem modernização ao setor elétrico. Além disso, a tão aguardada expansão da abertura do mercado livre de energia, que sem dúvida será o grande marco de evolução modelo energético brasileiro. Isso trará, portanto, uma nova dinâmica para o mercado livre com a liberalização do acesso dos consumidores de menor porte, trazendo o “varejo” para o segmento.
Tal movimento, sem dúvida, será um marco para o mercado de energia. Pois, além de democratizar o mercado livre, trará junto a necessidade de revermos urgentemente temas que há anos vêm se arrastando sem definitivas soluções. Entre eles, a formação de preços mais aderente ao mercado e sem volatilidades absurdas oriundas da imprevisível operação do sistema. Além disso, definir regras claras para os comercializadores varejistas, atores fundamentais nesta futura expansão do mercado livre.
A abertura do mercado é bem-vinda e desejada por todos os agentes. No entanto, devem caminhar junto de medidas necessárias para que essas incertezas, que ano após ano acompanham o setor elétrico brasileiro, resolvam-se definitivamente.
Desafios e mudanças, principalmente quando visam melhorias, são sempre bem recebidos. Entretanto, se queremos um mercado livre totalmente aberto e democrático, devemos, ao menos, oferecer um pouco mais de previsibilidade aos atuais e novos agentes do ACL.
Em resumo, não há possibilidade de haver rotina no próximo ano. Entre expectativas, avanços e soluções definitivas para o crescimento do mercado de energia, teremos que superar ainda muitos desafios. Porém, certos de que o setor elétrico brasileiro está caminhando para um futuro muito melhor, e mais maduro.