Os custos das tarifas de energia no Brasil estão entre os temas com maior discussão no setor elétrico. Tanto os efeitos sobre as tarifas quanto aqueles que estão sendo gerados atualmente, como os originados do despacho fora da ordem de mérito e que acumularam somente este ano R$ 5,4 bilhões. Meta é de avançar em ações que mitiguem os efeitos na conta de energia, principalmente em um momento em que a pandemia não mostra sinais de arrefecimento, pelo menos no cenário atual.
Nas últimas semanas, a Aneel anunciou uma série de medidas para tentar evitar reajustes elevados nas contas de luz diante de um panorama que combina pressões no câmbio e pendências de anos anteriores como a deliberação sobre um conjunto de medidas que atenuaram R$ 18,8 bilhões sobre a conta de energia. Outro custo que preocupa é a questão do Encargo de Serviço do Sistema derivado da GFOM que em quatro meses de 2021 já acumula R$ 5,4 bilhões.
As perguntas que rondam o mercado, por exemplo, são: como as tarifas de energia no Brasil vão se comportar neste ano e nos próximos? Os preços no mercado cativo continuarão atraindo a migração para o mercado livre? Para entender mais sobre o assunto, dois especialistas do setor falaram ao Giro Energia, podcast da Ecom Energia. Confira a seguir os principais pontos dessas entrevistas.
Aneel sinalizou reajustes menores que dois dígitos
Incerteza é a palavra que descreve bem o cenário das tarifas em 2021 e 2022. Quem explica é o diretor de regulação da TR Soluções, Helder Souza, que analisa como estão as pressões para quem é consumidor cativo e está considerando a migração para o mercado livre de energia. “Esse ano é de incerteza. A Aneel está buscando atenuar os efeitos e algumas dessas ações dependem de ações judiciais e de decisão das distribuidoras. A agência também indicou que os reajustes devem ser menores que dois dígitos, ou seja, menos de 10%. No início do ano a gente estimava alta de 17% a 18%”, avalia o executivo.
Na visão de Helder, isso implica então que metade do reajuste esperado ficou represado, ou seja, há uma boa pressão ainda sem certeza de como será aplicada. “Sem dúvida nenhuma. A maior parte das medidas da Aneel buscou atenuar as pressões. As três primeiras anunciadas, como a conta covid e o uso de P&D, já eram conhecidas, mas as outras são novidade, divulgadas no fim de abril, como o reperfilamento da transmissão, de nove transmissoras. Não houve tratamento dado dessas empresas e isso ficou no vácuo entre 2013 e 2017, mas há uma portaria que deu um norte sobre a questão. Esse passivo ficou condicionado a ser pago entre 2017 e 2024, mas a medida da Aneel posterga para pagar até 2027 e 2028, então empurrou mais alguns anos. Outras medidas são para uso na revisão das tarifas”, disse ao Giro Energia.
A pandemia pode aumentar os efeitos?
Helder explica ainda que a conta covid buscou atenuar os efeitos. “Os custos financeiros reconhecidos em 2020 e 2021 foram postergados para quatro anos. O cenário de impacto tarifário para os próximos anos, desse diferimento, tem outras pressões que podem reduzir, como a devolução de créditos tributários para os consumidores. Isso é um ponto positivo que deve amenizar o impacto nas tarifas de energia no Brasil”.
Mesmo amenizando o cenário, o executivo da TR Soluções avalia ainda se é possível ver reajustes de dois dígitos em 2022 e 2023. “Em 2022, vai depender muito de 2021, que a gente ainda não sabe como vai ser. Existem muitas distribuidoras que ainda vão passar por reajuste e não sabemos como será diferida essa conta. Por isso esse nível de incógnita alto, também depende de como a distribuidora vai querer diferir também. Esses efeitos poderão ser sentidos mais em algumas concessionárias que em outras, se o contrato é novo ou antigo, o contrato antigo é com indexador de IGP-M, que fechou ano passado em 31% e o efeito continua alto. Pode ter impactos diferentes entre regiões”.
Seca afeta os custos de operação do sistema
O racionamento de energia é uma hipótese bastante remota neste ano, mas a seca afeta os custos de operação do sistema e traz mais pressões de custos, diz o diretor da PSR, Rodrigo Gelli. O executivo analisa as pressões nas tarifas neste ano e no próximo. “As pressões devem continuar em 2022. Por exemplo, o custo de despacho térmico e o risco hidrológico, além de um eventual IGP-M alto; essas três componentes podem pressionar em 2022, sendo os dois primeiros com mais certeza. Neste ano essa incerteza diminuiu com o conjunto de medidas adotadas pela Aneel. Foram usadas várias ferramentas para atenuar a tarifa, como a indenização das transmissoras, redução da parcela B para algumas distribuidoras e uso de recursos de P&D. Dessa forma, os reajustes devem ficar perto de 9% no ano”.
Rodrigo disse ainda que o custo de operação do sistema está levando ao maior despacho térmico. “Isso tem muito a ver com o período seco e quão seco ele será. Essa é uma premissa razoável de que não teremos bandeira verde até dezembro, mas até outubro não acredito”, avalia.
Apesar da incerteza, o cenário continua estimulando a migração para o mercado livre na visão do especialista. “Não é um movimento novo. Ele ocorre desde 2016 e vem sendo estimulado pela baixa competitividade das tarifas e pelo aumento de encargos. As empresas buscam reduzir custos ao migrar para um ambiente que pode propiciar custos mais baixos”, explica Rodrigo.
Empresas devem continuar a buscar no mercado livre a redução de custos com tarifas de energia no Brasil
Há diversas dúvidas que rondam as tarifas de energia nesse ano e no próximo. O câmbio, o despacho térmico, o risco hidrológico, por exemplo, são variáveis que poderão pressionar os custos. Porém, apesar de a incerteza ser a palavra-chave que causa receio aos empresários, eles deverão continuar buscando o mercado livre de energia, a autoprodução e a geração distribuída solar para reduzir os custos com a conta de luz.
Por fim, diante desse cenário, ficam algumas perguntas: os aumentos do setor ficarão mesmo perto de 10% nesse ano? Como ficarão em 2022? A seca se tornará mais grave e provocará ainda mais pressões sobre a tarifa? A terceira onda prevista da pandemia poderá provocar mais danos sobre os caixas das distribuidoras? Fica aqui mais uma reflexão.