Você sabia que a meteorologia é fundamental na análise e formação do preço de energia elétrica no mercado livre? O Preço de Liquidação das Diferenças (PLD) é a variável mais importante para o Ambiente de Contratação Livre (ACL). Como resultado, o PLD afeta diretamente os preços de compra e venda de energia para as contratações de médio e longo prazos. Além disso, trata-se do preço base para contratações e liquidações de energia que não foram garantidas no mercado de Curto Prazo (CP).
Hoje, para conseguirmos otimizar o custo da operação energética, o detalhamento das informações meteorológicas é essencial no suporte à tomada de decisão. Isso é possível devido à grande evolução dos modelos meteorológicos e os incansáveis estudos que permitiram acesso a mais e melhores informações. Passamos a utilizar, há um pouco mais de 10 anos, informações sobre chuvas, temperatura e ventos para refinar as projeções dos preços de energia.
Como a análise meteorológica impacta a formação do preço de energia elétrica no Mercado Livre de Energia?
Uma série de esforços tem sido feita na matriz energética brasileira, composta majoritariamente por hidroelétricas, a fim de melhorar as previsões de vazões. Com isso, vem se incorporando cada vez mais dados sobre chuva no modelo chuva-vazão, desenvolvido pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Atualmente são utilizados três modelos meteorológicos de fontes distintas: GEFS (modelo do centro americano), ECMWF (centro europeu) e ETA (centro americano).
Como a atmosfera é regida pela teoria do caos, uma pequena perturbação nas condições iniciais de um evento pode gerar consequências enormes e absolutamente desconhecidas no futuro. Por isso, quanto maior for o número de previsões, melhor será o resultado delas.
Além disso, como sabemos, esses modelos têm dificuldade de estimar o valor correto da chuva, dada a extrema complexidade desse cálculo. Com isso, o ONS desenvolveu uma metodologia de remoção de viés de acordo com cada modelo meteorológico. Ou seja, observando o desempenho nos últimos 120 dias, já que estes modelos possuem sistematicamente tendências em diversas regiões. Logo, no cálculo do PLD consideram-se informações de 14 dias de previsão da combinação desses três modelos meteorológicos para um total de 100% das usinas hidráulicas dos Subsistemas Norte e Sul, 94% das usinas do Sudeste e 96% das usinas do Nordeste.
Projeção de temperatura
Uma outra variável extremamente importante para o planejamento da operação do sistema é a temperatura que norteia as projeções de carga para a semana à frente de previsão. Essa projeção é feita com os mesmos modelos meteorológicos, mas no horizonte de semana operativa. Com a entrada do preço horário essa projeção foi detalhada para o dia seguinte e de forma mais média nos dias seguintes.
Com o constante crescimento da geração eólica, que é uma fonte intermitente, os desafios se tornaram ainda maiores para o operador do sistema. A necessidade de se planejar para o dia e semana seguintes se tornou imprescindível.
O modelo utilizado hoje na previsão de geração eólica tem como um dos insumos, a previsão de vento para as usinas de cinco diferentes modelos meteorológicos com horizontes diferentes de previsão e resoluções variadas. Além disso, essas previsões de vento passam por uma correção utilizando um ajuste de regressões lineares. Ou seja, existe uma projeção para cada um dos 48 períodos ao longo do dia (de meia em meia hora). Os modelos atmosféricos utilizados pelo ONS são ECMWF 1, ECMWF 2, GFS, BAM e CPTEC. As correções do vento são feitas com base nos 30 dias que antecedem a previsão. Os estudos indicaram que com poucos dias as correções ficavam muito voláteis e com um número grande de dias o viés não era bem identificado. Por último, é feito uma combinação entre esses modelos meteorológicos.
Detalhamento de informações traz preço de energia elétrica no mercado livre mais ajustado
O detalhamento dessas informações, além de trazer confiabilidade para o operador, traz um preço de energia elétrica no mercado livre mais ajustado ao que irá se realizar com o despacho por mérito. Porém, é claro que isso depende ainda de muitas outras informações que não iremos detalhar aqui. Mas vale ressaltar o comprometimento do operador em refinar suas previsões. No entanto, essas previsões ainda estão muito longe de se tornarem capazes de antecipar um período crítico.
As dificuldades para antecipar período secos
Cinco estados brasileiros, entre eles São Paulo, enfrentam a pior seca em 91 anos. De acordo com um comitê de órgãos do governo federal, que emitiu pela primeira vez na história um alerta de emergência hídrica para o período de junho a setembro. O cenário atípico exige do operador um planejamento ainda mais estratégico, tendo em vista que essa condição não ocorreu do dia para a noite.
Nos últimos 10 anos vem se observando constantemente chuvas abaixo da média histórica nos principais aproveitamentos hidroelétricos que possuem grande capacidade de regulação. Dessa forma, se observarmos apenas o período úmido de 2020/2021, temos um déficit de chuva de -33% no Grande, -25% no Paranaíba, -31% no Tocantins e -22% no São Francisco, que são as bacias com os maiores reservatórios do Sistema Interligado Nacional.
Por fim, mesmo com a notória evolução dos modelos meteorológicos, ainda esbarramos na falta de uma previsibilidade mais confiável nos meses à frente. Essa situação, por sua vez, sofre ainda mais impactos desse cenário incomum da crise hídrica. O desafio, então, será antecipar meses tão secos como observamos em 2020 e 2021. No entanto, deve-se considerar essa possível imprecisão de previsibilidade e implementar outros mecanismos de planejamento energético para evitar outra crise hídrica com a atual. Apesar de o fantasma do apagão ter voltado a nos assombrar, o Brasil tem fontes capazes de compor uma matriz segura e diversificada. Inclusive, com fontes renováveis, como eólica ou solar, além de empresas dispostas a investir.